sábado, 21 de janeiro de 2012

Estupraram a minha consciência

O ano de 2012 inicia-se de modo tosco. Veio a tona um episódio irrelevante, mas que em algum momento super dimensionou-se e se tornou num dos assuntos mais comentados do pais.

O hipotético estupro ocorrido num reality show nacional as conversas nas ruas, preenche as páginas na internet, espalha-se pelos noticiários.

E, ao constatar a importância dada a este reality show e a suposta violência sexual(que a meu ver, sequer ocorreu), sinto que é a minha consciência que está a ser estuprada.

Sim, ela tem sido cruelmente violentada pelos meus semelhantes, que ruborizam-se diante da possibilidade do estupro, mas seguem atentos as cenas seguintes, bebendo da fonte de sua aversão.

Tem sido violada pela possibilidade da censura virtual, e pelo desinteresse com que tratam a isto os meus semelhantes. E, enquanto uma guerra é travada lá fora, e esta decidirá o futuro do mais importante meio de comunicação existente. Imprensa e meus congêneres, insistem em estuprara a minha consciência, com estupidez, desdém e parcialidade.

Ah, a imprensa. Verdade, imparcialidade, estes parecem estar se tornando termos esquecidos. Para a “Vênus platinada”, heróis anônimos são, na verdade, vilões, e nossos defensores nesta cyber batalha, não passam de indivíduos perigosos e desprezíveis.

Não esqueço; para esta emissora, somos todos contraventores. Pelo menos foi isso o que ela fez parecer, numa curta reportagem de qualidade dúbia.

A meu ver, o grupo “Anonymous” executa um grande trabalho no mundo virtual. Heróis que trabalham em sigilo, de modo tenaz, por afeição a causa(Espero não estar enganado).

Para a imprensa, torno a dizer: não passam de vilões, facínoras.

Por fim, assevera um proeminente jornalista: “Já fomos mais inteligentes”. Sim, de fato, já fomos. Porém, esta inteligência degenerou-se, com grande colaboração da imprensa, classe que este senhor integra.

E afirmo: uma curta frase de impacto não nos fará mais inteligentes. A meu ver, esta manifestação, pura e simples, o faz parecer mais arrogante e estúpido, nada mais.

Não é a singela piada de Luiza que me agride, mas a repercussão a ela dada, é, sim, ofensiva.

O pretenso estupro e sua popularidade, são culpa nossa, mas a incansável divulgação do fato é de responsabilidade da classe que conta com o perspicaz indivíduo capaz de julgar o nível de nossa inteligência.

Também é de responsabilidade desta classe a pouca ou nula atenção dada a temas de extrema importância, colaborando assim, para a alegada falta de inteligência.

Então, aqui de baixo já enxergo alguns tetos de vidro, e sinto ser cruelmente ferida por semelhantes e superiores, a minha consciência. Sabe-se lá, até quando.

Joy division - Love will tear us appart


quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Poema em linha reta - Fernando Pessoa

Certa feita ouvi este poema, e de imediato identifiquei-me com o mesmo. Hoje, novamente o escutei e de pronto, percebi que deveria publicá-lo aqui, pela sua genialidade, e também porque sou um destes, que não conhece sequer uma pessoa que tenha "levado porrada".

Poema em linha reta - Fernando Pessoa

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.